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W.E.

depois daquelas vezes todas teve a vez de uma sereia tão pequena para um mar de bolinhas de coca-cola, no sol de uma tarde que parecia manhã. teve leezão antes disso, laço em uma das sete cabeças do VHS, com café bem forte pra enxaguar a boca do gosto de hortelã de ontem.

as últimas vezes são às vezes na minha, às vezes nas suas, às vezes com rosa púrpura, com purpurina, mas sem cairo. teve almoço às sextas-feiras, às vezes de gravata, jantar ao amanhecer, às vezes café sem cafeína, sem cinema, sorvete ao sol, às vezes derretido, melancolia à sombra e a música do ano. teve autógrafo na televisão, teve um monte de gente da televisão deitada na cama do andy, sem madonna, e seis vezes em seis meses de pequenos vidros que brilharam no escuro, como monitores de plasma, de água do mar jogada de volta ao mar de volta ao mar de volta ao mar, águas profundas.

teve visitas semestrais, algumas vezes menos, algumas vezes mais. algumas vezes era só por telefone, disque m. agora tem vertigem na sala do apartamento cento e onze enquanto sean penn sapateia seus olhos azuis no apartamento onze. teve filme preto e branco e vontade de pegar um trem em tecnicolor, rumo a pleaseantville.

nós não íamos ao cinema de novo e não acho isso de todo mal, sabe? a gente sempre escolhe filmes cheios de dúvida, eu durmo de roupa e duvido quem nunca, são cabeças demais à frente demais, cabeças sem final demais. afinal, o cinema é mais como uma desculpa, às vezes, uma boa desculpa. e se não vamos mais tanto ao cinema, já não precisamos mais desse tipo de desculpa. talvez seja bom ver as outras vezes que não a vez do filme da vez, ou talvez fosse bom nós irmos mais ao teatro. sempre é bom só te ver e essas outras vezes sem cinema são, na realidade, a melhor ficção que se poderia imaginar. e embora tenham tido vezes das quais não me lembre de muito, eu lembro muito de você toda vez.

rebobine, por favor.

então teve a vez do anel no dedo em que assistimos ao filme do lado de fora, a vez que ficamos para fora e a vez que você foi ao cinema e eu não. teve a vez em que almoçamos juntos na grécia, e depois andamos muito para procurar uma carteira que eu não consegui encontrar. teve vasos e fios, e cafés e ciúmes antes disso. teve também a outra vez, com calamares marinados em que ficamos ilhados por mares calados. teve a vez em que viajamos de atenas para nova iorque em poltronas legais de couro sintético da primeira classe. teve a vez de muito calor e medo do que viria, até encontrarmos uma raspadinha premiada logo ali na esquina que vendia suco.

teve a vez que você ia embora de novo. e a vez que vimos de novo aquela juventude sônica passar. dessa vez juntos, mas ainda sem banquinhos de lontra. teve a vez que você estava cercada de muitos abraços, pendurando sombras gigantescas em pequenas paredes, com sapato de crocodilo e louvores. depois disso, teve um coquetel anual de parabéns e mais um ano com muitas crianças caminhando, linguagem do gesto e sinais de cansaço nas aulas de karatê. foi aí que a gravata começou a apertar, só percebi depois.

teve as duas vezes que nos dependuramos por dias em rodapés da sala e nem vimos quem entrava ou saia. teve aquela vez do clark kent metrossexual naquele ano novo fora de época que não tinha fim. o super-homem apareceu quando eu tive que engolir segredos ao invés de hambúrguer e teve a vez em que comemos uma porção de batatas à três.

teve a vez que te visitei com uma sombra do que estaria por vir.
e teve a vez que visitamos a isabella rosselini vestida de cortina azul.

a vez que quisemos ter um filho na califórnia, mas não nos deixaram por causa da censura indicativa. a vez em que atravessamos o canal da mancha a nado com memórias salgadas. teve a vez que você me deu um bolo, teve as vezes que eu dei bolo. você é um doce, e acho que por isso eu tenho medo quando esbraveja.

teve aquela vez que abandonamos o barco para tomar um lambrusco, e depois de ficar da cor do vinho, te acompanhei até o metro por caminhos que não tinham fim. e teve outra vez em que me perdi por um outro caminho sem fim, só para ver uma menina linda que comia listas telefônicas. minha sorte foi estar acompanhado por um coelho que deixava jujubas por onde passávamos.

teve a vez que eu quis tanto que você voltasse, e você voltou me trazendo um cavalo cintilante que morreu, mas continua a galopar em compassos esparsos. eu que primeiro te dei um cavalo cintilante, mas isso foi bem antes dessa vez, naquele dia que eu precisava que você me salvasse do perigo iminentemente prateado. eu lembro querer que você tivesse fitas cassete portáteis de alta fidelidade, me desculpe se elas não funcionaram muito bem. teve também a vez em que as pessoas eram estranhas, mas tinha um castelo nas índias, bollywood sem cinema, uma cara furada e uma veia saltada.

tiveram algumas outras vezes em meio a essas todas, em que houve uma mesma música que parecia la bamba, sobre um metrô que ainda não existia, com voz adocicada e café fraco que eu gosto. em uma dessas, fizemos planos para daqui a pouco na vitrola, e começamos a colocar os discos com cheiro antigo em ordem alfabética. a gente tem essa mania de fazer planos pra daqui a pouco um pouco depois. eu gosto deles, e da ordem alfabética.

teve a vez em que você quis casar com um pote de mostarda, e eu disse que estava enjoado de catchup. casar com a mostarda pode não ser fácil, embora seja saboroso. mas bom mesmo seria casar com o padre e comprar o enxoval em uma rede de fast-food chinesa.

teve a vez do meu parabéns com aquele verde-limão que você sabe que eu gosto, e acho que só gosto tanto desse verde para não entrarmos mais na discussão sobre o verde ser azul. sabe que eu sinto falta da nossa não concordância sobre a nomenclatura das cores, no fundo eu sei que você sempre tem a razão, e as cores numeradas que me faziam mal.

teve a vez de você no meu ombro triste, pela segunda vez, e eu não quero lembrar desta vez, daquelas pessoas altas naquele cabaret pretensiosamente francês, com gente dançando músicas aleatórias e muitos assobios. lembro, porque foi a vez em que eu disse i’m not leaving you, porque te amo.

teve a vez em que houve homens de plástico que queríamos fabricar, mas ao invés disso, os compramos pela internet e os levamos a um mesmo cinema que não existe mais. teve a vez em que voamos em uma lagosta inflável que nos dizia sobre um lugarzinho antigo aonde nós podemos ficar juntos.

teve a vez que fomos visitar uns desenhos que nos garantiram serem lindos, mas em meio de gente nem tanto, não os usamos e acabamos na esquina da raspadinha premiada, sem nenhum prêmio ainda.

teve a vez em que a lua estava tão bonita de novo, e dessa vez, a segunda, fui eu que a percebi. em ambas não houve uma vez de lua bonita ao seu lado, nossos amigos nos disseram sobre ela. nessa época já tínhamos amigos, mesmo ainda sendo um pouco contra eles.

teve a vez em que todas as verdades, até então, foram reveladas e eu tive medo de segredos que você agora sabe, e só você sabe como foi difícil descobrir que a chave deles estava sempre debaixo do carpete da escada. no andar de cima, dessa vez fui eu que chorei no ombro da zebra.

teve a vez em que eu fui a liz taylor e atrasei de novo.
teve a vez do gato que eu ainda não tenho, por medo do pulo.
teve a vez em que acordei cedo para ver uma exposição que não existia.
teve o dia que eu voltei, e você foi a primeira a estar comigo.

teve aquela vez que durou seis meses. e antes, teve a vez em que eu não disse adeus não sabendo que o adeus não dito iria durar tanto. durou tempo suficiente para saber não dizer mais adeus.

antes disso houve vezes em inglês, sometimes, with english tea que parecia água suja, curry digital que dava dor de barriga, câmeras obscuras de vigilância, faca e ermo. teve gente perdida na musica do metrô que demorava quase uma hora e meia para chegar, enquanto nós desenhávamos tijolinhos de cocô de beuys nas páginas de torneiras abertas, com jornais sensacionalistas e pés jogados nos bancos do vagão. teve ostras anexadas a camarões olhudos olhando para o pôr-do-sol em waterloo do segundo andar de qualquer ônibus. essas vezes pareciam uma roda-gigante de um olho só.

teve também aquela vez em que eu te dei um abraço de aniversário quase um mês depois. teve aquela vez que eu cheguei meio bêbado para um jantar na sua casa com um presente meia-boca, meio bobo das dificuldades de saber se meu problema tinha a ver com o pelo no ovo ou com a galinha. teve também a vez dos espelhos de máscara de coelho, com pisco-sour e pisca-pisca néon, de noite de friozinho gostoso, foi gostoso, foi brilhante como clara de ovo. tem o agora, que também é parabéns. e o depois de muitas outras vezes.

quer assistir ao filme novo da madonna comigo?





P.S.

os copos de bolinha viraram caco, mas não foi minha culpa, eu juro que não estava no roteiro. os cavalos estão guardados na prateleira, os cavalgo ainda, de vez em quando. não como mais coisas azuis, nem as verdes, mas ainda gosto muito do verde-limão. estou me conformando com a gravata e os enforcamentos e prometo não dar mais bolos. estou mais atento quanto aos atrasos, mas isso eu te digo em uma próxima vez.

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